terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Meio ambiente – Mais uma face maquiada que cai por terra


Muitos acharam estranho não inserirmos qualquer matéria sobre o caso da última e criminosa contaminação do Rio Paraíba do Sul em novembro passado, por parte da empresa Servatis. Nós mesmos aqui na redação, ficamos divididos, se publicávamos ou não alguma coisa e, finalmente, optamos por não fazê-lo. Achávamos que seria inútil ficar repetindo o que todos os jornais e blogs estariam publicando, muitos preocupados em divulgar um “furo de reportagem” e/ou mesmo vender notícias, coisa que nunca passou por nossa cabeça, até porque não vivemos disso. Temos este espaço para expor opiniões, divulgar informações técnicas, entreter com educação, enfim, apresentar uma proposta séria, mas ao mesmo tempo leve e real, de forma que todos os que venham a ler o blog, eventualmente ou corriqueiramente, entendam o que está acontecendo ou o que poderá acontecer. Nossa proposta é simples: levar a sério o assunto meio ambiente. Não é nenhuma proposta mirabolante, simplesmente procurar enxergar as coisas de forma prática, real e transparente.

Pois bem, hoje nos deparamos com a notícia de que a empresa causadora da contaminação das águas do Rio Paraíba do Sul com endosulfan (pesticida altamente tóxico, com alto poder residual, que está sendo banido dos maiores mercados mundiais, capaz de provocar danos irreversíveis ao sistema nervoso além de ser potencialmente cancerígeno), a Servatis, com sede em Resende, RJ, possui certificado ISO 14001, comprovado no site da mesma, muito bem elaborado, exaltando aos quatro ventos a sua responsabilidade ambiental. É respeito ao meio ambiente de ponta a ponta no site.

Essa empresa é reincidente e nesse último episódio omitiu informações sobre o vazamento, que causou a mortandade de toneladas de peixes em período de piracema, prejudicando a vida de pessoas que dependem da pesca para sobreviver e que tiveram a atividade proibida por tempo indeterminado, impossibilitou o consumo de peixe em toda a região, provocou a interrupção do abastecimento de estações de tratamento de água de vários municípios, prejudicou as atividades agropecuárias que dependem da água do rio para se desenvolverem, causando baixas na produção rural, tudo isso afetando diretamente a vida de nada mais nada menos, 12 milhões de pessoas.

A onda tóxica contaminou o rio justamente durante o fenômeno da piracema, quando os peixes sobem o rio para desova, afetando drasticamente as 80 espécies de peixes que ali ocorrem, comprometendo a reprodução desses animais na região por três anos. Cem por cento das amostras coletadas de peixes mortos das espécies com valor comercial estavam cheias de ovos. Essas fêmeas desovariam entre o Natal e o Ano Novo. Jamais se viu uma situação tão dramática na região, dizem os especialistas.

Na ocasião, autoridades policiais e de órgãos técnicos responsáveis fizeram uma vistoria na empresa e constataram diversas irregularidades, principalmente em relação ao armazenamento inadequado do produto, representando risco iminente de vazamento para o meio ambiente.

A multa arbitrada pelo órgã
o responsável, de R$ 33 milhões, levou em consideração a precária situação financeira da empresa, a qual, obviamente, recorrerá e não pagará um centavo, como ocorre com 99% das multas emitidas. Mais uma vez a “impunidade verde” prevalecerá. Todos os responsáveis pelos crimes ambientais continuarão soltos.

Não bastasse tudo isso, a empresa faz propaganda enganosa em seu site divulgando ser certificada em ISO 9.000 e ISO 14.000. Mais um caso de “maquiagem verde”. Não é possível que essa empresa tenha conseguido essa certificação nos últimos dias. Certamente já era certificada, já era de conhecimento dos órgãos ambientais tal certificação, já se tinha conhecimento da tal maquiagem. Não é possível, pelos caminhos normais, que uma certificadora em suas auditorias aprovasse as condições inadequadas de armazenamento de um produto altamente tóxico, constatadas pelas autoridades após o acidente. Esse é o retrato da área de meio ambiente no país. Descaso, incompetência e despreparo das autoridades, negligência e também despreparo, omissão, conivência de certificadoras e a irresponsabilidade costumeira do empresariado, hereditária desde os primórdios desse país, tendo como lema o lucro acima de tudo, não importa como. Se der para enganar, vamos enganar, vamos tripudiar que não acontece nada mesmo. Esse é o pensamento. É o caos total. Funcionários públicos que garantem posição social com seus carguinhos nas infindáveis instituições desse país, diretor disso, presidente daquilo, chefe, encarregado, garantindo seus míseros salários pagos pela população sem fazer o que deveriam fazer, fingindo que trabalham; políticos eleitos e sustentados pelo povo na mesma situação, presidentes, governadores, prefeitos, que fingem que remuneram seus funcionários e também garantem os seus e as suas mordomias, tudo mantido pelo povo; empresários descompromissados com o social, visando somente o lucro, fingindo que pagam e explorando ao máximo seus empregados, dilapidando os recursos naturais do país, sonegando e corrompendo; e o povo que também finge que trabalha, sonega, omite-se, convive com a impunidade, corrompe, corrompe-se, além de ser explorado e enganado por todos eles. Se cada um desses agentes tivesse o mínimo de comprometimento social, ético, humanista, essas coisas não aconteceriam. A “maquiagem verde” anda junto com a “impunidade verde”.