Pedro Porfírio escreveu e nós transcrevemos:
A SEMENTE DA DÚVIDA QUE ABALA A JUSTIÇA
"Esse episódio está deixando a população e o mundo jurídico perplexos".
Romualdo Sanches Calvo Filho, Presidente da Academia Paulista de Direito
Não tenha dúvida: depois que o ministro Gilmar Mendes queimou instâncias duas vezes para mandar soltar o banqueiro Daniel Valente Dantas, a Justiça não será a mesma aos olhos do povo. O STF ainda aparecia como a última esperança contra a impunidade. Agora, como uma onda no mar, nenhum cidadão com o mínimo de senso crítico vai entender por que o plutocrata que ofereceu um milhão de dólares a um delegado para livrar sua cara não pode passar uns dias em cana, experiência que até o Paulo Maluf viveu, apesar de seu traquejo nas sendas da impunidade.
Pior será quando, sem ter como explicar suas peripécias que comprometem meio mundo em todos os poderes, inclusive no Judiciário, o senhor dos anéis atravessar o Atlântico, na mesma rota do coleguinha Salvatore Alberto Cacciola. Com as modernas ferramentas da comunicação, ele não terá dificuldade de comandar seus negócios através de prepostos escolados que já aprenderam os macetes deste mundo fanaticamente corrupto, que põe Sodoma e Gomorra no santuário.
Com mais bala na agulha, Daniel, o festejado, o amigão de todos os figurões da República, terá a protegê-lo uma rede competente de informantes, a salvo de juízes íntegros e delegados incorruptíveis. De posse de informações íntimas de nossas ínclitas autoridades em todos os podres poderes e com assessoria do coronel israelense Avner Shemeh, um "batuta" em espionagem privada, ele manterá seu reinado incólume e ainda dará mais asas à sua fértil imaginação.
Já aqui, o Juiz Fausto Martin de Sanctis irá para ao banco dos réus do Conselho Nacional de Justiça pelo crime de insistir em mandá-lo para a prisão, contrariando o presidente do Supremo, que também é presidente do Conselho. O Juiz Fausto Martins de Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, é um especialista em casos que envolvem lavagem de dinheiro. Com a fama de rigoroso, já condenou o doleiro Toninho Barcelona, seqüestrou obras de arte do ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, e pediu a prisão do magnata russo Boris Berezovsky, suspeito de ser um dos investidores ocultos do Corinthians.
E o delegado Protógenes Queiroz, que coordenou as investigações, já está com a batata assando, conforme noticiou a Folha de S. Paulo deste domingo, em meio a uma orquestrada campanha que jé fala de um estado policial, que só existe porque alguma coisa está sendo feita, no estrito limite da lei, atingindo alguns donos do País, nesse velhacouto acostumado a pintar e bordar sob a proteção dos cobres que cobrem qualquer indelicadeza adversa. Enquanto não desfazem por inteiro o trabalho do Ministério Público Federal e da PF, recorro aos meus arquivos implacáveis, onde as peripécias do banqueiro baiano já ocupam um bom espaço.
Suborno na Justiça
E vou encontrar duas peças preciosas: uma delas é a desesperada entrevista da Juíza Márcia Cunha de Carvalho, quando titular da 2ª Vara Empreserial do Rio de Janeiro. No caso da Juíza Maria Cunha, ela própria procurou o jornal O Globo no final de setembro de 2005 para denunciar a tentativa de suborno do banco de Daniel Valente Dantas na pendência judicial com os fundos de pensão pelo controle da Brasil Telecom.
"Fui nomeada titular da vara em dezembro do ano passado (2004). Em fevereiro, uma pessoa contatou meu marido e disse: ""Vi que você tem acesso a diversos desembargadores e juízes de vara empresarial. Queria trabalhar junto, fazer parcerias"". Meu marido, aposentado e advogado, acabara de montar um escritório. A pessoa queria que ele advogasse para o Opportunity, oferecendo um contrato astronômico, em que o cliente pagaria todo mês um valor certo, tendo ou não ação. No caso, um grande mensalão. Tenho prova de que ele fez a oferta".
A entrevista da Juíza
Como ninguém se lembrou de retirar do baú essa entrevista, faço sua transcrição para que você conheça melhor a personalidade desse plutocrata.
Quem fez a proposta?
Meu marido contou que recebeu a proposta de Eduardo (Rascovisky) e achava, no início, que não ia se concretizar, mas acabou confirmada. Era muito dinheiro. Basicamente, para fazer lobby. Conversamos sobre ela num domingo. Ele disse que era uma proposta excelente. Respondi que com o Opportunity não ia dar, porque havia ação na minha vara. Só não sabia qual porque tinha acabado de entrar. Eduardo até disse a meu marido que tinha uma ação na vara, mas não era importante.
Que ações eram essas?
Entrei na internet em casa e vi que havia dois números de ação do Opportunity na 2ª Vara. Na segunda-feira, fui ver que ações eram essas e descobri que uma era simplesmente a mais importante de todas que o Opportunity tinha, pelo controle do grupo (de empresas administradas pelo banco, entre elas a Brasil Telecom). Falei para o Sérgio (marido) que ele não podia aceitar de maneira alguma. Ele contatou a pessoa e disse que não aceitava. A pessoa disse que isso não tinha nada a ver e pronto.
O que aconteceu depois?
A primeira decisão que dei na ação beneficiava o Opportunity. Logo surgiu o boato de que minha suspeição seria argüida porque minha filha estagiava no escritório Andrade & Fichtner, que patrocinava os fundos de pensão. Já havia despachado várias ações deles. Nunca havia me passado na cabeça qualquer suspeita, mas pedia a minha filha para sair do escritório em março. No mesmo período, o escritório foi substituído pelo Paulo César Pinheiro Carneiro. Em maio, este entra com o pedido de antecipação de tutela, pedindo que eu declarasse a nulidade de um acordo que o Opportunity fez em nome de todos, mas que só beneficiava ele, que dizia: "Se eu for destituído por qualquer destas partes como administrador, toda vez que o grupo social tiver que votar prevalece a minha intenção de voto".
Qual foi sua decisão?
O Opportunity tinha menos de 10% de todo o investimento. Os outros dois têm, cada um, cerca de 40%. Ele, com menos de 10%, ia mandar mesmo afastado. Isso por 15 anos. Isso é abuso de poder. Sustei os efeitos do acordo.
O que a senhora achou da abordagem feita ao seu marido?
Eu entendi aquilo como uma tentiva de corrupção. por que eles iam escolher o meu marido, com um escritório que estava começando, oferecendo uma vantagem tão grande? Qual o interesse deles? Só isso. Soube depois que esse tipo de abordagem não foi só comigo. Outros colegas que tinham processo no Opportunity sofreram este tipo de abordagem.
Sobre a outra peça, falarei oportunamente.