Com características ímpares, o maior criadouro de fauna marinha do estado do Rio de Janeiro, a Baía de Sepetiba, no litoral sul do estado já teve a sua morte decretada há algum tempo. Abrangendo os municípios do Rio de Janeiro, Itaguaí e Mangaratiba, a baía vem sofrendo com todo tipo de agressão, vê sua fauna diminuindo drasticamente e o pescador artesanal uma espécie em extinção.
Pescar, atividade tradicional na baía, está praticamente impossível. São muito poucos os pescadores que resistem às dificuldades. A pesca embarcada e a manutenção dos barcos dependem diretamente da boa vontade das marés para se ter acesso à lâmina d’água. O assoreamento das margens é uma constante. O maior causador de agressões à baía é a poluição hídrica, proveniente de esgotos domésticos e de efluentes industriais sem qualquer tratamento. Para complicar a vida dos pequenos pescadores, é constante a pesca industrial criminosa na baía (predatória). Sem qualquer fiscalização dos órgãos ambientais, os barcos pesqueiros não se intimidam praticando a pesca de arrasto, altamente prejudicial a todas as formas de vida existentes na baía.
A população já cansou de esperar as promessas dos políticos sobre os projetos de despoluição, de saneamento, dentre outras, nunca concretizadas. O que se vê são grandes projetos industriais que também prometem muitos benefícios às comunidades de entorno e nada trazem, a não ser benefícios para seus controladores e acionistas. Os projetos se instalam fundamentados em Estudos de Impactos Ambientais muito questionáveis, e sob o aval dos órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental, muitos deles destruindo áreas de manguezais (áreas de preservação permanente), realizando dragagens mal avaliadas, dentre outros enormes disparates. A única ação concreta ocorrida nos últimos anos em prol da baía e das populações de entorno, foi o início do processo de descontaminação do terreno da falida Mercantil Industrial Ingá, muito esperado pelas comunidades e ambientalistas da região. Apesar de iniciado pela administração da massa falida da empresa e agora sob a responsabilidade da Usiminas que arrematou o terreno para instalação de mais um gigantesco terminal de minério, a população só vai acreditar quando terminar o processo. Os pescadores agora querem ver para crer, pois estão cansados de serem enganados pelas autoridades.
Nada vem sendo feito de prático e benéfico para as comunidades existentes na área. Não se vê projetos de saneamento, de melhoria urbanística, de educação ambiental, de geração de emprego e renda, de capacitação profissional, de fomento à pesca e outras atividades que empreguem a mão-de-obra local. O que se vê são os pescadores tentando arrumar emprego em outras atividades, muitos deles se marginalizando por não terem capacitação adequada para tais oportunidades. Os que conseguem alguma coisa têm que se contentarem com sub-empregos. A mão-de-obra mais capacitada (com melhores salários) para atender aos projetos instalados na região vem de outros municípios ou regiões.
A área mais preservada da baía é a área do clube particular da marinha e do Presidente da República, a Marambaia, sob a guarda das Forças Armadas.
Infelizmente, o que se vê até o momento é a destruição dos manguezais, o assoreamento intenso, poluição das águas por lixo e esgotos domésticos e industriais (metais pesados), ocupações desordenadas em suas margens, pesca predatória (industrial), dragagens indiscriminadas, poluição atmosférica causada por efluentes gasosos e partículas minerais (minério de ferro principalmente de gigantescos pátios de estocagem), lançamento descontrolado de águas de lastro de navios atracados nos portos, tráfego intenso de cargueiros de grande porte, rodovias em péssimo estado de conservação, áreas urbanas desestruturadas incapazes de suprir as necessidades básicas das comunidades que crescem indiscriminadamente às margens da baía e o turismo e o comércio local prejudicados por toda essa situação. Aquelas praias que os banhistas lotavam para se cobrir com areias monazíticas medicinais há algumas décadas atrás, estão totalmente assoreadas e poluídas. Ninguém se atreve a reviver a experiência. Os que têm contato com esse material normalmente apresentam doenças de pele, infecções intestinais, dentre outros males. Esse é o quadro dramático que assola a Baía de Sepetiba.
E a preocupação dos pescadores e ambientalistas não para por aí. A perspectiva de instalação de novos mega projetos é muito grande. A continuar o ritmo de falta de planejamento e devastação, a baía morrerá em curtíssimo espaço de tempo. Com ela vai o pescador artesanal e sua cultura (artes de pesca, apetrechos, culinária, etc.), sua fauna, o turismo, e todas as comunidades ribeirinhas, pois, nessas condições, vai ser impossível viver próximo à baía. A continuar a promiscuidade e a conivência dos órgãos ambientais em relação a implantação desses projetos, prevê-se a destruição dos últimos resquícios de manguezais, a poluição generalizada das praias e o aumento da poluição industrial, o que aumentaria consideravelmente a ocorrência de chuvas ácidas, já comuns na região.
Os únicos beneficiários desse processo todo são os grandes grupos empreserais instalados, os quais não têm a menor preocupação com as comunidades e o meio ambiente do entorno. Os políticos, certamente, se beneficiam com esse processo todo sustentando seus discursos em prol do “desenvolvimento sustentável” (a maioria nem sabe do que se trata) e garantindo suas futuras campanhas com o apoio dessas empresas. O povo e o meio ambiente que se lixe.