
As diversas leis ambientais criadas nos últimos 40 anos, que possibilitaram a instituição de parques, reservas e estações ecológicas, praticamente congelaram a devastação da Mata Atlântica. No entanto, as normas bloquearam também a continuidade das atividades tradicionais executadas pelas populações que, reconhecidamente, foram as maiores responsáveis pelo que ainda restou do bioma.
Caiçaras, descendentes de quilombolas e indígenas mantêm aspectos culturais seculares e praticam, sobretudo, agricultura voltada à subsistência. São reconhecidos por conviver com a mata sem destruí-la. No entanto, parte das terras utilizada há centenas de anos por essa população foi sobreposta por unidades de preservação ambiental. Parte considerável dessa população foi impedida de desenvolver suas roças, de caçar e de extrair da mata produtos que ajudavam na sobrevivência.

Segundo ambientalistas, seria necessária uma postura propositiva de dialogar com as comunidades para que elas pudessem continuar vivendo e mantendo a relação que sempre tiveram com o meio ambiente, e não da forma como o Estado fez nos últimos anos, principalmente a partir da criação dos parques, que originou um processo de expulsão dessas comunidades.
Outros agentes econômicos tomaram esse espaço e o estrago está sendo muito maior, na medida em que essas comunidades não estão lá para ocupar da forma como tradicionalmente a área foi ocupada.

A roça de coivara é um bom exemplo das atividades dos povos tradicionais que preservaram a mata. Consiste num sistema de rodízio na utilização da terra, sem a necessidade de expansão da área cultivada.
Os povos tradicionais da região de Mata Atlântica derrubavam a mata, faziam roça de arroz, milho, feijão e mandioca e não compravam nada a não ser o sal. Colhiam, vendiam e ainda tinham para comer. Nenhum gênero alimentício vinha de fora. Sobreviviam com suas próprias atividades. Depois da criação de unidades de conservação, muitos abandonaram a agricultura, dedicando-se somente às pesca, não podendo mais derrubar mata. Os caiçaras, quilombolas e indígenas perderam o chão, pois a vida era fazer uma roça manejada pela própria comunidade. A agricultura familiar ficou praticamente desativada, o que dificultou as condições de vida desses povos.

A partir de então, as comunidades, em parceria com a administração do parque, encontraram uma solução jurídica para o impasse. Cruzando várias legislações, tanto do ponto de vista social quanto ambiental, criaram o que é chamado de “plano de uso tradicional”. Trata-se de um pacto social, um acordo estabelecido com todos os órgãos gestores para que a comunidade possa permanecer na área, garantindo seus direitos adquiridos de permanência, desenvolvimento das suas atividades e seus hábitos culturais cotidianos.
Duas comunidades quilombolas da região já conseguiram concretizar o pacto. Na prática, o plano consiste num cadastramento de todos os ocupantes, uma caracterização de como vivem, seus hábitos e suas dependências. Também define o desenvolvimento de projetos para implantação de uma série de atividades para desenvolvimento sustentável e as áreas e locais apropriados para que essas práticas possam se desenvolver.

Começaram a extrair a polpa da palmeira juçara (símbolo da Mata Atlântica) de um jeito sustentável, não arrancando todos os cachos, escolhendo-se um para deixar, pois as aves e outros animais utilizam-se da palmeira que é vital para a vida da floresta. Um grupo de índios Guarani, que habita uma reserva indígena no município de São Sebastião, em meio a Mata Atlântica, permanece realizando suas atividades tradicionais, mas incorporaram novos meios de cultivo que preservam a mata nativa. Passaram a usar mudas de pupunha, mudas de açaí, que também dão em palmeiras, para preservar a palmeira juçara.


